Não é possível viver um grande amor sem sacrifícios.
cedo ou tarde, a necessidade dele se coloca. então descobrimos do que somos feitos.
A vida exige destemor e desapego. Em algum momento temos de arriscar, saltar no escuro, avançar sem certeza do que vai pela frente. Sobretudo no amor. Se a gente pensa demais, hesita demais, pondera demais, não acontece. As oportunidades passam, a vida passa, sem que a gente se comprometa.
Do que é mesmo que estou falando? Das opções difíceis que as relações amorosas nos oferecem. Estou falando de sacrifício.
Cada pessoa que escolhemos nos faz um tipo de exigência subjetiva. Às vezes elas são simples – como namorar e ter uma vida leve, parecida com a nossa própria. Outras vezes as escolhas são menos óbvias – como ao amar alguém que traz uma dor, ou uma carga ser partilhada.
Tenho um amigo que, assim como tantos, casou-se com uma mulher que tinha dois meninos. Ele, sendo jovem e livre, poderia ter se esquivado, mas não. Abraçou a situação e tentou ser para os garotos o melhor padrasto possível. Gostar da mulher era fácil. Quando tudo deu errado, lá na frente, por outras razões, ele sabia que havia tentado verdadeiramente.
Eu estou cada vez mais convencido que não é possível viver um grande amor sem sacrifícios. Cedo ou tarde a necessidade dele se coloca. Então descobrimos do que somos feitos.
Se uma mulher tem filhos e isso parece trabalhoso para o homem, uma mulher sem filhos provavelmente gostará de tê-los – e essa situação não será mais confortável que a anterior. Um homem com filhos pode parecer um fardo para uma mulher jovem, mas qual o fardo de viver sem o homem que ela ama?
Tenho a impressão de que vivemos acorrentados à nossa zona de conforto. Nos acostumamos a estar seguros e tranquilos. Viramos contumazes egoístas. Não abrimos mão da liberdade, do sossego, do espaço, do dinheiro, do corpo bem cuidado. Mas, neste caso, o que exatamente vamos dar ao outro, além da nossa companhia?
Conheço uma moça que se casou com um rapaz que é filho único de pais apegados – e de uma classe social diferente da dela. Ela poderia, sedutora como é, erguer uma barreira e separar gradualmente o marido dos pais, para não ser incomodada. Mas não é o que ela faz. Outro dia, saiu em viagem com o marido e os sogros, por mais de duas semanas. Quando eu perguntei onde ela achava energia, a resposta foi simples: “Comprei o pacote. Se eu não fizer isso, o homem que eu amo vai ficar infeliz”. Faz sentido, não faz?
O que não faz sentido é uma vida confortável e vazia.
Cada vez que a gente se abre verdadeiramente para o outro, corre o risco de ser envolvido pelo drama da vida dele. Problemas de saúde. Depressão. O pai que bebe. A irmã maluca. É mais fácil estender um cordão sanitário em volta de si mesmo – ou do seu casamento estagnado – e evitar com unhas e dentes qualquer coisa que atrapalhe. Mas isso, de forma muito clara, significa renunciar a viver. Ou, pelo menos, a viver aspectos essenciais da sua própria existência.
Nós somos filhos dos nossos temores, porém. Fomos educados pelo medo. A perspectiva da alegria brilha menos do que a lembrança do infortúnio. Por isso somos cautelosos e egoístas. Por isso deixamos que o futuro passe ao largo sem esboçar um gesto para detê-lo. Depois nos queixaremos, velhotes, que a vida não trouxe nada fora do cardápio. Quando ofereceu, recusamos.
Melhor seria se nos deixássemos levar pela mão do amor a circunstâncias novas e misteriosas. Seríamos mais felizes se pudéssemos amar o outro tão profundamente que as mesquinharia ficassem para trás como malas inúteis. Se pudéssemos fazer com que as necessidades do outro fossem parte da nossa vida, seríamos como um. Ou quase.
Como se chega a isso? Não sei. Perdemos a fórmula, se algum dia ela existiu. Agora teremos de improvisar e descobrir. Certamente, não adianta afirmar, a todo momento, as nossas prioridades, as nossas necessidades e os nossos medos. A vida exige coragem. E amar exige generosidade.
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