De repente, o coração pede uma maior profundidade. Surge o desejo de procurar um outro sentido para a vida e uma conexão com algo maior. Seguindo esse forte impulso, nos tornamos buscadores espirituais. Ao trilharmos esses novos caminhos, surgirão riscos e perigos, mas também infinitos presentes e alegrias. Saiba agora quais são eles.
No começo, pode ser algo difuso, um sentimento de que alguma coisa não vai bem. A vida pode estar até muito boa, mas parece sem sentido. Ou, infelizmente, ela pode estar muito ruim. Nesses momentos angustiantes, em que podemos nos confrontar com repetidas crises, nos sentimos em um beco sem saída. O coração clama por mais alívio, felicidade, paz, alegria, não mais com base no que nos oferece o mundo material, mas a partir de algo mais interno e profundo. Assim, inicia-se uma jornada que pode levar anos até a chegada a um porto seguro, que pode estar, inclusive, na religião abandonada em algum momento da vida, agora vista sob outra perspectiva. Essa viagem interna tem alguns estágios. Vamos traçá-los em etapas, com os alertas necessários e as grandes alegrias que podemos encontrar nesse caminho.
{ 1 } A inquietação
Ela pode surgir ainda na juventude, quando um verdadeiro leque de caminhos espirituais se apresenta à nossa frente. Ou, então, bem mais tarde, quando surgem com mais insistência as perguntas existenciais: qual o sentido da vida? quem sou eu? para onde vou depois de morrer? As crises, inerentes a qualquer idade, também podem nos puxar para essa reflexão, que nos impulsiona a encontrar uma via capaz de atender às necessidades do espírito.
O monge beneditino inglês Dom Laurence Freeman, presidente da Comunidade Mundial de Meditação Cristã, por exemplo, acredita que a procura inicial de respostas em várias religiões pelos jovens é uma tendência natural. “Eu mesmo, criado numa família católica, fui me afastando da religião dos meus pais na faculdade. Torneime um leitor voraz de livros sobre ioga, meditação e religiões orientais. Essa sede juvenil de conhecimento pode se prolongar até bem mais tarde e por muitos anos”, avalia Dom Laurence. Mas, no seu caso, foi ao se aprofundar em sua própria tradição de origem que ele redescobriu sua fé, por volta dos 28 anos. “Quando nos detemos no sentido mais profundo do que nos foi ensinado, começamos a enxergar coisas que não víamos antes. É como olhar para uma torrada de pão integral durante muito tempo: aos poucos, vamos percebendo as sementes que podem estar dentro da massa, seus relevos e sulcos, suas cores. De repente, nos vemos diante de algo que nunca havíamos percebido, uma revelação.”
O monge budista vietnamita Thich Nhat Hanh também incentiva os jovens a buscarem sua própria tradição. Quando recebe estrangeiros no seu centro budista, no sul da França, os estimula a retornar para sua religião de origem depois de conhecerem valores universais de outras linhas espirituais e incorporá-los à sua tradição. “Não vejo nenhum motivo para passar a vida inteira provando uma só espécie de fruta”, diz ele com bom humor no livro Vivendo Buda, Vivendo Cristo (ed. Rocco).
Outro momento em que a inquietação torna-se muito presente ocorre na meia-idade, quando pode iniciar-se uma busca de um sentido mais profundo para a vida. “Até os 35, 40 anos, a existência é totalmente voltada para fora: trabalhar, procriar, produzir. Na segunda metade da vida, começa a jornada para o mundo interno, e para a busca de uma espiritualidade mais intensa”, escreveram as autoras inglesas Anne Brennan e Janice Brewi no livro Arquétipos Jungianos – A Espiritualidade na Meia-idade (ed. Madras). É outra fase de grande inquietação, que vai apressar e favorecer a fase seguinte.
{2} O chamado
De repente, em meio a esse incômodo interno, recebemos um chamado: algum ensinamento espiritual nos toca. Nesse momento, ele responde a todas as nossas perguntas. Podemos continuar a vida inteira em contato com ele, mas o mais provável é que esse caminho deixe de ser satisfatório. Foi o que aconteceu com a tradutora paulista Virginia Murano. “No meu caminho espiritual inicial, provei um amor imediato. E amar de repente, e com tal intensidade, vinha colado a uma entrega inexorável.” Por um momento, a escolha se revelou acertada, mas, em alguns anos, tornou-se decepção. “Rompi com a religião por uns 30 anos. Não conseguia compreender que a espiritualidade não precisasse estar atrelada necessariamente a uma linha religiosa tradicional.” Tempos mais tarde, em um momento de crise, ela acabou lendo um livro em francês que modificou sua vida. “Lia e relia sempre. Comecei a traduzi-lo para mim, depois para outras pessoas.” Diálogos com o Anjo (Editora de Cultura) marcou Virginia com outro tipo de amor, dessa vez mais profundo. Suas páginas falavam sobre o relato de uma mulher que havia vivenciado uma experiência espiritual extraordinária na Hungria, durante a Segunda Guerra e sob o nazismo. Gitta Mallasz, a sobrevivente, e três amigos judeus começaram a se perguntar sobre sua própria responsabilidade diante do horror que viviam. “Do seu questionamento, começaram a surgir respostas carregadas de uma verdade incontestável. Por 17 meses, esse pequeno grupo de amigos acessou a melhor parte de si para falar de um novo tempo que estava para vir”, conta Virginia. Os jovens deram a esse aspecto interno o nome de anjo, ou mestre interior. Segundo afirmavam, a parte matéria do ser humano fazia as perguntas e a parte iluminada do mesmo ser, feita de luz, dava as respostas. Uma capacidade que seria inerente a qualquer ser humano, com o treino necessário. Virginia conseguiu editar o livro no Brasil e contatar o casal de franceses que conviveu com Gitta Mallasz durante seus últimos dez anos de vida. Hoje, ela os representa e continua esse trabalho aqui. “É um acesso à possibilidade de evolução do ser humano. Uma grande aventura interna em direção a uma estrada inesperada que conduz para o que é novo.” A inquietação acalmou-se e ela, finalmente, encontrou seu caminho.
“A busca pode vir acompanhada de ansiedade e devoção cega, pois algumas pessoas se entregam muito rapidamente, e de forma emocional, a certas práticas sem avaliar de maneira objetiva os benefícios que podem experimentar e os riscos que podem correr”, Virginia Murano, tradutora
{3} Os primeiros passos
Antes de se entregar totalmente a uma linha espiritual, é necessário um tempo para averiguar a escolha. Sister Mohini Panjabi, diretora responsável pela América do Sul na Organização Brahma Kumaris, dá conselhos essenciais sobre os cuidados nessa entrega. “A busca pode vir acompanhada de ansiedade e devoção cega, pois algumas pessoas se entregam muito rapidamente, e de forma emocional, a certas práticas sem avaliar de maneira objetiva os benefícios que podem experimentar e os riscos que podem correr”, afirma. “Elas pulam de cabeça em grupos, seitas ou igrejas que encontram, atraídas por promessas de cura, riqueza, felicidade fácil.” E isso é um perigo. Para avaliar melhor a escolha, Sister Mohini nos aconselha, em primeiro lugar, a manter um coração limpo e claro, para que nossa visão torne-se perspicaz. É necessário averiguar, depois, se nesse caminho há um corpo de conhecimentos profundos e acessíveis que possam responder às nossas necessidades internas (condição que nos protege do culto à individualidade de um falso mestre). A via escolhida, segundo Sister Mohini, também deve apresentar uma forma de meditação, oração ou conexão com o divino que possa nos fortalecer internamente e realizar uma transformação interior. Depois, de uma maneira bem prática, é preciso verificar onde o dinheiro é empregado e qual o comportamento moral e ético dos seus líderes. “É igualmente bom saber se essa linha espiritual estimula uma interação compassiva com o mundo ou se mantém uma ação social de serviço”, diz a iogue indiana. São luzes de grande valia para um iniciante considerar.
{4} Os riscos
Praticante com mais de 40 anos de busca espiritual, o gerente administrativo paulista Jairo Graciano dá outras indicações valiosas: “É preciso pesquisar na internet toda informação a respeito do grupo escolhido, ler seus livros e folhetos com distanciamento. Nosso lado racional e crítico pode ajudar nessa hora”. Uma de suas experiências ruins ocorreu com um mestre, muito cordial e extrovertido, que se dizia seguidor de um grande líder espiritual indiano (este sim, verdadeiro). “É uma tática – eles usam o nome de um mestre conhecido e se dizem seus seguidores. Nesse caso, fui descobrir depois que um texto assinado por esse falso mestre era, na verdade, plágio de um outro.” Ele aconselha, portanto, que o aluno procure se aproximar de quem orienta um grupo – para observá-lo mais atentamente. “É olho no olho: se alguém se diz mestre, olhe bem para ele, abstraia sua aparência e tente enxergar seu interior e suas intenções”, diz ele. Jairo aconselha também a sentir a intuição – se ela avisa que há algo errado, é bom acender o sinal amarelo. “Desconfie se o que é dito é justamente o que você quer ouvir quando está infeliz: promessas cheias de otimismo sem fundamento, curas miraculosas, aspirações abrangentes e vagas, do tipo paz universal, prosperidade sem limites ou amor transcendental. Também não se deixe levar por templos lindos ou ambientes aconchegantes. Tudo isso é secundário. Ainda preste atenção se os praticantes mais antigos parecem estar hipnotizados, mesmerizados pelo mestre e pelo que ele propõe. É sinal de que perderam sua consciência.” A busca requer paciência e o porto seguro pode levar muito tempo para chegar – no caso dele, hoje com 67 anos, isso aconteceu só há pouco. “Cheguei ao Dzogchen, o Caminho da Grande Perfeição, uma linha do budismo tibetano que existe há seis anos apenas. Conheci o mestre Namkhay Norbu pelas mãos de alguém muito querido e, finalmente, me encontrei”, afirma, convicto.
“Se uma pessoa quiser ser mais feliz, ou ter paz de espírito, ela pode trilhar um caminho espiritual por um tempo e ver se ele atende a seus objetivos. Tudo depende das metas de cada um”, Lama Samten.
{5} A entrega sábia
Lama Samten é reconhecido nos meios budistas como um líder íntegro e compassivo. Gaúcho, foi professor de física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e hoje mantém centros de meditação em vários pontos do país. Sua visão dos caminhos espirituais é sábia – e desconcertante. “Um praticante deve olhar para uma via espiritual apenas como um percurso para chegar a um destino. Por isso, é preciso que ele tenha bem claro em sua mente o que está buscando”, diz. Em outras palavras, se é alívio financeiro, talvez seja melhor se empenhar mais no trabalho ou trocar de atividade profissional se não estiver satisfeito com seus rendimentos. Se o caso for uma desilusão amorosa, uma terapia pode ser mais indicada. “Mas, se uma pessoa quiser ser mais feliz, ou ter paz de espírito, por exemplo, ela pode trilhar um caminho espiritual por um tempo e ver se ele atende a seus objetivos. Tudo depende das metas de cada um.” E adverte: “Todo caminho e grupo tem problemas. É necessário não mitificá-lo. Ele é apenas um instrumento, uma ferramenta para se atingir algo. As dificuldades com o grupo, ou com o próprio mestre, as pequenas decepções sempre vão existir. O fundamental é avaliar se o caminho está cumprindo as metas espirituais que você estabeleceu”. A entrega, nesse caso, será sábia e saudável. Não será mais pela paixão, mas pela consciência e pelo reconhecimento profundo. Dessa maneira, a escolha terá muito mais chances de dar certo.
* Por Liane Alves - Revista Bons Fluídos.
{ 1 } A inquietação
Ela pode surgir ainda na juventude, quando um verdadeiro leque de caminhos espirituais se apresenta à nossa frente. Ou, então, bem mais tarde, quando surgem com mais insistência as perguntas existenciais: qual o sentido da vida? quem sou eu? para onde vou depois de morrer? As crises, inerentes a qualquer idade, também podem nos puxar para essa reflexão, que nos impulsiona a encontrar uma via capaz de atender às necessidades do espírito.
O monge beneditino inglês Dom Laurence Freeman, presidente da Comunidade Mundial de Meditação Cristã, por exemplo, acredita que a procura inicial de respostas em várias religiões pelos jovens é uma tendência natural. “Eu mesmo, criado numa família católica, fui me afastando da religião dos meus pais na faculdade. Torneime um leitor voraz de livros sobre ioga, meditação e religiões orientais. Essa sede juvenil de conhecimento pode se prolongar até bem mais tarde e por muitos anos”, avalia Dom Laurence. Mas, no seu caso, foi ao se aprofundar em sua própria tradição de origem que ele redescobriu sua fé, por volta dos 28 anos. “Quando nos detemos no sentido mais profundo do que nos foi ensinado, começamos a enxergar coisas que não víamos antes. É como olhar para uma torrada de pão integral durante muito tempo: aos poucos, vamos percebendo as sementes que podem estar dentro da massa, seus relevos e sulcos, suas cores. De repente, nos vemos diante de algo que nunca havíamos percebido, uma revelação.”
O monge budista vietnamita Thich Nhat Hanh também incentiva os jovens a buscarem sua própria tradição. Quando recebe estrangeiros no seu centro budista, no sul da França, os estimula a retornar para sua religião de origem depois de conhecerem valores universais de outras linhas espirituais e incorporá-los à sua tradição. “Não vejo nenhum motivo para passar a vida inteira provando uma só espécie de fruta”, diz ele com bom humor no livro Vivendo Buda, Vivendo Cristo (ed. Rocco).
Outro momento em que a inquietação torna-se muito presente ocorre na meia-idade, quando pode iniciar-se uma busca de um sentido mais profundo para a vida. “Até os 35, 40 anos, a existência é totalmente voltada para fora: trabalhar, procriar, produzir. Na segunda metade da vida, começa a jornada para o mundo interno, e para a busca de uma espiritualidade mais intensa”, escreveram as autoras inglesas Anne Brennan e Janice Brewi no livro Arquétipos Jungianos – A Espiritualidade na Meia-idade (ed. Madras). É outra fase de grande inquietação, que vai apressar e favorecer a fase seguinte.
{2} O chamado
De repente, em meio a esse incômodo interno, recebemos um chamado: algum ensinamento espiritual nos toca. Nesse momento, ele responde a todas as nossas perguntas. Podemos continuar a vida inteira em contato com ele, mas o mais provável é que esse caminho deixe de ser satisfatório. Foi o que aconteceu com a tradutora paulista Virginia Murano. “No meu caminho espiritual inicial, provei um amor imediato. E amar de repente, e com tal intensidade, vinha colado a uma entrega inexorável.” Por um momento, a escolha se revelou acertada, mas, em alguns anos, tornou-se decepção. “Rompi com a religião por uns 30 anos. Não conseguia compreender que a espiritualidade não precisasse estar atrelada necessariamente a uma linha religiosa tradicional.” Tempos mais tarde, em um momento de crise, ela acabou lendo um livro em francês que modificou sua vida. “Lia e relia sempre. Comecei a traduzi-lo para mim, depois para outras pessoas.” Diálogos com o Anjo (Editora de Cultura) marcou Virginia com outro tipo de amor, dessa vez mais profundo. Suas páginas falavam sobre o relato de uma mulher que havia vivenciado uma experiência espiritual extraordinária na Hungria, durante a Segunda Guerra e sob o nazismo. Gitta Mallasz, a sobrevivente, e três amigos judeus começaram a se perguntar sobre sua própria responsabilidade diante do horror que viviam. “Do seu questionamento, começaram a surgir respostas carregadas de uma verdade incontestável. Por 17 meses, esse pequeno grupo de amigos acessou a melhor parte de si para falar de um novo tempo que estava para vir”, conta Virginia. Os jovens deram a esse aspecto interno o nome de anjo, ou mestre interior. Segundo afirmavam, a parte matéria do ser humano fazia as perguntas e a parte iluminada do mesmo ser, feita de luz, dava as respostas. Uma capacidade que seria inerente a qualquer ser humano, com o treino necessário. Virginia conseguiu editar o livro no Brasil e contatar o casal de franceses que conviveu com Gitta Mallasz durante seus últimos dez anos de vida. Hoje, ela os representa e continua esse trabalho aqui. “É um acesso à possibilidade de evolução do ser humano. Uma grande aventura interna em direção a uma estrada inesperada que conduz para o que é novo.” A inquietação acalmou-se e ela, finalmente, encontrou seu caminho.
“A busca pode vir acompanhada de ansiedade e devoção cega, pois algumas pessoas se entregam muito rapidamente, e de forma emocional, a certas práticas sem avaliar de maneira objetiva os benefícios que podem experimentar e os riscos que podem correr”, Virginia Murano, tradutora
{3} Os primeiros passos
Antes de se entregar totalmente a uma linha espiritual, é necessário um tempo para averiguar a escolha. Sister Mohini Panjabi, diretora responsável pela América do Sul na Organização Brahma Kumaris, dá conselhos essenciais sobre os cuidados nessa entrega. “A busca pode vir acompanhada de ansiedade e devoção cega, pois algumas pessoas se entregam muito rapidamente, e de forma emocional, a certas práticas sem avaliar de maneira objetiva os benefícios que podem experimentar e os riscos que podem correr”, afirma. “Elas pulam de cabeça em grupos, seitas ou igrejas que encontram, atraídas por promessas de cura, riqueza, felicidade fácil.” E isso é um perigo. Para avaliar melhor a escolha, Sister Mohini nos aconselha, em primeiro lugar, a manter um coração limpo e claro, para que nossa visão torne-se perspicaz. É necessário averiguar, depois, se nesse caminho há um corpo de conhecimentos profundos e acessíveis que possam responder às nossas necessidades internas (condição que nos protege do culto à individualidade de um falso mestre). A via escolhida, segundo Sister Mohini, também deve apresentar uma forma de meditação, oração ou conexão com o divino que possa nos fortalecer internamente e realizar uma transformação interior. Depois, de uma maneira bem prática, é preciso verificar onde o dinheiro é empregado e qual o comportamento moral e ético dos seus líderes. “É igualmente bom saber se essa linha espiritual estimula uma interação compassiva com o mundo ou se mantém uma ação social de serviço”, diz a iogue indiana. São luzes de grande valia para um iniciante considerar.
{4} Os riscos
Praticante com mais de 40 anos de busca espiritual, o gerente administrativo paulista Jairo Graciano dá outras indicações valiosas: “É preciso pesquisar na internet toda informação a respeito do grupo escolhido, ler seus livros e folhetos com distanciamento. Nosso lado racional e crítico pode ajudar nessa hora”. Uma de suas experiências ruins ocorreu com um mestre, muito cordial e extrovertido, que se dizia seguidor de um grande líder espiritual indiano (este sim, verdadeiro). “É uma tática – eles usam o nome de um mestre conhecido e se dizem seus seguidores. Nesse caso, fui descobrir depois que um texto assinado por esse falso mestre era, na verdade, plágio de um outro.” Ele aconselha, portanto, que o aluno procure se aproximar de quem orienta um grupo – para observá-lo mais atentamente. “É olho no olho: se alguém se diz mestre, olhe bem para ele, abstraia sua aparência e tente enxergar seu interior e suas intenções”, diz ele. Jairo aconselha também a sentir a intuição – se ela avisa que há algo errado, é bom acender o sinal amarelo. “Desconfie se o que é dito é justamente o que você quer ouvir quando está infeliz: promessas cheias de otimismo sem fundamento, curas miraculosas, aspirações abrangentes e vagas, do tipo paz universal, prosperidade sem limites ou amor transcendental. Também não se deixe levar por templos lindos ou ambientes aconchegantes. Tudo isso é secundário. Ainda preste atenção se os praticantes mais antigos parecem estar hipnotizados, mesmerizados pelo mestre e pelo que ele propõe. É sinal de que perderam sua consciência.” A busca requer paciência e o porto seguro pode levar muito tempo para chegar – no caso dele, hoje com 67 anos, isso aconteceu só há pouco. “Cheguei ao Dzogchen, o Caminho da Grande Perfeição, uma linha do budismo tibetano que existe há seis anos apenas. Conheci o mestre Namkhay Norbu pelas mãos de alguém muito querido e, finalmente, me encontrei”, afirma, convicto.
“Se uma pessoa quiser ser mais feliz, ou ter paz de espírito, ela pode trilhar um caminho espiritual por um tempo e ver se ele atende a seus objetivos. Tudo depende das metas de cada um”, Lama Samten.
{5} A entrega sábia
Lama Samten é reconhecido nos meios budistas como um líder íntegro e compassivo. Gaúcho, foi professor de física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e hoje mantém centros de meditação em vários pontos do país. Sua visão dos caminhos espirituais é sábia – e desconcertante. “Um praticante deve olhar para uma via espiritual apenas como um percurso para chegar a um destino. Por isso, é preciso que ele tenha bem claro em sua mente o que está buscando”, diz. Em outras palavras, se é alívio financeiro, talvez seja melhor se empenhar mais no trabalho ou trocar de atividade profissional se não estiver satisfeito com seus rendimentos. Se o caso for uma desilusão amorosa, uma terapia pode ser mais indicada. “Mas, se uma pessoa quiser ser mais feliz, ou ter paz de espírito, por exemplo, ela pode trilhar um caminho espiritual por um tempo e ver se ele atende a seus objetivos. Tudo depende das metas de cada um.” E adverte: “Todo caminho e grupo tem problemas. É necessário não mitificá-lo. Ele é apenas um instrumento, uma ferramenta para se atingir algo. As dificuldades com o grupo, ou com o próprio mestre, as pequenas decepções sempre vão existir. O fundamental é avaliar se o caminho está cumprindo as metas espirituais que você estabeleceu”. A entrega, nesse caso, será sábia e saudável. Não será mais pela paixão, mas pela consciência e pelo reconhecimento profundo. Dessa maneira, a escolha terá muito mais chances de dar certo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Fico muito feliz com seu comentário!!! :)