Acordei na praia com a voz do vizinho:
– O papa renunciou!
Meu primeiro pensamento foi de solidariedade aos colegas jornalistas. Trabalhei muito tempo em redação de jornais e revistas antes de me tornar autor de novelas. Imaginei a correria de meus antigos companheiros de profissão, até mesmo de amigos que continuam no batente. Alguns de ressaca correndo para as redações, tentando apurar notícias, com confetes caindo dos cabelos. Conto agora uma intimidade do mundo jornalístico: não há nada pior que uma notícia desse peso em pleno feriado. É quase impossível encontrar alguém para dar uma declaração que preste. Furo, então, como conseguir?
Passada a surpresa, fui tomar sol. Sim, tive dias ótimos na Praia do Engenho, no Litoral Norte de São Paulo. Diante do mar, pensei: “Que será da Igreja agora?”. A mudança de um papa, ainda mais um conservador como Bento XVI, é uma chance de renovação. Sou católico. Sempre me emociono com a mensagem de amor e acolhimento de Jesus Cristo. Mas faz falta um novo São Francisco de Assis, capaz de abandonar as estruturas rígidas do clero para se aproximar profundamente das dores do homem comum.
Os conservadores rejeitam a ideia de mudança. Nenhum religioso deseja que alguém seja infectado pelo vírus HIV. Mas a Igreja Católica insiste contra o uso de preservativos nas relações sexuais. Dentro dela mesma, a questão do celibato sacerdotal é cada vez mais urgente. Já conheci pelo menos dois religiosos que tinham vida sexual ativa, com casos amorosos quase públicos, um heterossexual e outro homo. Os amigos e mesmo alguns fiéis, em torno, fechavam os olhos. Suspeito que a maioria de vocês já tenha ouvido falar de algum padre que pulava a cerca. Para não entrar em exemplos da vida real, basta lembrar O crime do padre Amaro, de Eça de Queiroz, do século XIX, obra-prima da literatura portuguesa que narra o romance entre um religioso e uma jovem. O celibato sacerdotal só foi aprovado no Concílio de Niceia, em 325. O cristianismo já existia havia três séculos quando passou a ser exigido.
– O papa renunciou!
Meu primeiro pensamento foi de solidariedade aos colegas jornalistas. Trabalhei muito tempo em redação de jornais e revistas antes de me tornar autor de novelas. Imaginei a correria de meus antigos companheiros de profissão, até mesmo de amigos que continuam no batente. Alguns de ressaca correndo para as redações, tentando apurar notícias, com confetes caindo dos cabelos. Conto agora uma intimidade do mundo jornalístico: não há nada pior que uma notícia desse peso em pleno feriado. É quase impossível encontrar alguém para dar uma declaração que preste. Furo, então, como conseguir?
Passada a surpresa, fui tomar sol. Sim, tive dias ótimos na Praia do Engenho, no Litoral Norte de São Paulo. Diante do mar, pensei: “Que será da Igreja agora?”. A mudança de um papa, ainda mais um conservador como Bento XVI, é uma chance de renovação. Sou católico. Sempre me emociono com a mensagem de amor e acolhimento de Jesus Cristo. Mas faz falta um novo São Francisco de Assis, capaz de abandonar as estruturas rígidas do clero para se aproximar profundamente das dores do homem comum.
Os conservadores rejeitam a ideia de mudança. Nenhum religioso deseja que alguém seja infectado pelo vírus HIV. Mas a Igreja Católica insiste contra o uso de preservativos nas relações sexuais. Dentro dela mesma, a questão do celibato sacerdotal é cada vez mais urgente. Já conheci pelo menos dois religiosos que tinham vida sexual ativa, com casos amorosos quase públicos, um heterossexual e outro homo. Os amigos e mesmo alguns fiéis, em torno, fechavam os olhos. Suspeito que a maioria de vocês já tenha ouvido falar de algum padre que pulava a cerca. Para não entrar em exemplos da vida real, basta lembrar O crime do padre Amaro, de Eça de Queiroz, do século XIX, obra-prima da literatura portuguesa que narra o romance entre um religioso e uma jovem. O celibato sacerdotal só foi aprovado no Concílio de Niceia, em 325. O cristianismo já existia havia três séculos quando passou a ser exigido.
Particularmente, acho um horror haver religiosos que não cumprem o celibato. Ninguém é obrigado a fazer votos e abdicar da vida sexual. Mas, se assumiu o compromisso, deve cumpri-lo. A transgressão faz do religioso um hipócrita, alguém que prega alguma coisa e faz outra. Essa hipocrisia enraizada corrói a relação com os fiéis e com a própria essencia da fé. Se o celibato fosse flexibilizado, em algumas ordens pelo menos, haveria menos padres mentirosos e mais padres com verdadeira vocação para pregar a fé. Ser celibatário seria questão de escolha. As igrejas protestantes, onde os pastores casam e têm filhos, têm algum problema por causa disso? De jeito nenhum. Estão aí, vigorosas, com um número crescente de crentes. Já é hora de permitir que os padres se casem.
Também chegou o momento de a Igreja ser mais rigorosa com os crimes sexuais. Casos de pedofilia envolvendo membros do clero foram denunciados em vários países do mundo e comprovados nos Estados Unidos, na Irlanda, na Alemanha e na Bélgica. Segundo Barbara Dorris, da Survivors Network of those Abused by Priests (Snap), associação que congrega vítimas de abusos sexuais por religiosos, o papa Bento XVI, diante da questão, apenas pediu desculpas, sem atitudes práticas. É óbvio que a pedofilia não é um problema exclusivo da Igreja Católica. Mas, se ocorre nela, cabe ao papa punir gravemente os abusos comprovados. A esperança é que, com um próximo papa menos conservador, a pedofilia seja erradicada.
A eleição de um papa mais liberal também seria importante para um dos grandes impasses da Igreja hoje em dia: a questão homossexual. A Igreja é fortemente pressionada para assumir atitudes mais liberais. O papa Bento XVI se recusou. Recentemente, o ministro do Vaticano para a Família, Vicenzo Paglia, pronunciou-se a favor dos direitos civis para gays e lésbicas. Ou seja, discorda-se a respeito do assunto dentro do próprio Vaticano. A sociedade caminha mais rapidamente que a Igreja. Não acho que haja uma queda na fé. Os homens querem simplesmente uma igreja que os acolha. E não é assim Cristo, que abriu os braços para acolher a humanidade? Espero que, na próxima vez que estiver na praia, acorde com a notícia de um gesto lindo e emocionante do próximo papa que contribua para a existência de uma verdadeira Igreja dos Homens.
Também chegou o momento de a Igreja ser mais rigorosa com os crimes sexuais. Casos de pedofilia envolvendo membros do clero foram denunciados em vários países do mundo e comprovados nos Estados Unidos, na Irlanda, na Alemanha e na Bélgica. Segundo Barbara Dorris, da Survivors Network of those Abused by Priests (Snap), associação que congrega vítimas de abusos sexuais por religiosos, o papa Bento XVI, diante da questão, apenas pediu desculpas, sem atitudes práticas. É óbvio que a pedofilia não é um problema exclusivo da Igreja Católica. Mas, se ocorre nela, cabe ao papa punir gravemente os abusos comprovados. A esperança é que, com um próximo papa menos conservador, a pedofilia seja erradicada.
A eleição de um papa mais liberal também seria importante para um dos grandes impasses da Igreja hoje em dia: a questão homossexual. A Igreja é fortemente pressionada para assumir atitudes mais liberais. O papa Bento XVI se recusou. Recentemente, o ministro do Vaticano para a Família, Vicenzo Paglia, pronunciou-se a favor dos direitos civis para gays e lésbicas. Ou seja, discorda-se a respeito do assunto dentro do próprio Vaticano. A sociedade caminha mais rapidamente que a Igreja. Não acho que haja uma queda na fé. Os homens querem simplesmente uma igreja que os acolha. E não é assim Cristo, que abriu os braços para acolher a humanidade? Espero que, na próxima vez que estiver na praia, acorde com a notícia de um gesto lindo e emocionante do próximo papa que contribua para a existência de uma verdadeira Igreja dos Homens.
Walcyr Carrasco / Revista Época.
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