Foi na sexta-feira passada, dia 25 de maio, em uma competição de natação na academia. Cheguei passando da hora, mas ainda em tempo de ver o apito, o salto na água e o toque da mãozinha na borda da piscina. Fiz questão de lembrá-la, momentos antes, que mais importante que vencer era dar o melhor de si e curtir aquele momento. Mas aconteceu algo que não estava nos meus planos, nem nos dela. Não foi a derrota, nem a vitória. Foi a injustiça.
Todos os dias, quem tem filhos, se pega falando – e falando de novo – sobre a importância de sermos justos. A gente, que é adulto, faz questão de repartir o bolo em partes iguais, de ensinar que se consegue o brinquedo do outro emprestando o próprio brinquedo e que até na hora de discutir um assunto tem a vez de um e a de outro falar.
O exercício da justiça nos ajuda a ensinar valores preciosos às crianças. Elas aprendem que justiça não é sinônimo de complacência – e que ela, a justiça – raramente agrada a todas as partes. Ao expressar a justiça em atitudes mostra-se, sobretudo a igualdade de direitos e as regras do jogo. E as crianças percebem que suas escolhas sempre terão consequências, sejam elas certas ou não.
O esporte dá lições importantes de justiça a todo momento. Não vale o que grita mais alto. As faltas são punidas. Se infringir as regras, será desclassificados. Pelo menos é assim que deveria ser. É por isso que acho o esporte tão saudável do ponto de vista ético e moral. E foi por essa razão que coloquei minha filha na natação quando ela tinha apenas 4 anos de idade.
Estou falando de uma competição infantil em uma academia de bairro, que não tem por objetivo formar campeões olímpicos. Suas pretensões são contribuir para a saúde, ensinar a nadar, socializar. Ao colocar seus alunos na água para competir com seus colegas de turma, o objetivo é estimular o espírito competitivo e a auto-superação. Todas as crianças recebem medalhas. É uma grande festa. Acho tudo isso muito saudável e louvável.
Mas erra, e erra feio, quem menospreza a capacidade de uma criança de entender o que está acontecendo – e imagina que elas não serão capazes de entender trapaças ou deslizes dos adultos. Foi o que aconteceu. Minha filha, de 7 anos, chegou empolgada para o evento. Assistiu feliz as amigas competirem antes dela. Ao ser chamada para a beira da piscina notou que ao seu lado teria apenas mais uma criança (talvez pelo tamanho, pela marcação de tempo das últimas aulas). Seria uma prova para apenas duas competidoras.
A criança ao seu lado, porém, queria desistir. Os professores tentaram insistentemente – e com muito carinho, é bom que se diga - convencê-la a competir. De longe, não pude ouvir o que falavam, mas era nítido que estavam imbuídos de boa intenção. No revezamento de argumentos, venceram os professores. A menina se colocou em posição para saltar. Estava pronta.
Aí veio o desfecho. Antes do apito, porém, a menina saltou. No impulso de ver a outra na água, minha filha também pulou, mas parou em seguida, certa de que o professor pediria que as duas voltassem. Aos 7 anos já se sabe muito bem o que é queimar uma largada e quais são as regras do jogo. O professor, no entanto, ao notar que aquela criança que resistiu até o último momento, estava indo em frente, olhou para a minha filha e chacoalhou a mão, pedindo para ela continuar.
Em desvantagem ela continuou – e nadou. Recuperou quase todo o tempo perdido, empurrada por boa parte dos pais que estavam ali. Mas tocou em segundo lugar a borda da piscina. Levantou a cabeça e olhou para mim. Desabou a chorar. Ela olhava para mim, no fundo dos meus olhos, e perguntava: ”Por que foram injustos comigo? Eu que não fiz frescura e tentei fazer tudo certo, porque comigo?”
Chorou como eu nunca vi. Não jantou, não queria explicações. Estava digerindo a injustiça – não intencional – de um professor. Posso imaginar o que passou, naquela fração de segundo, na cabeça do professor: foi tanto esforço para conseguir que aquela criança pulasse na água que, se eu pedir para voltar, vai desistir de novo. O professor só esqueceu que ali, do outro lado, tinha outra criança, super a fim de competir e que foi ensinada, por ele mesmo, a fazer as coisas certas, a respeitar as regras.
No dia seguinte, conversamos com calma, mãe e filha. Retomamos ponto a ponto, mas não neguei a injustiça. Por mais que alguém diga que foi tudo bobagem, que é tempestade em copo d’água, que aquilo não tem valor nenhum, acho sério, bem sério. Mãe sabe diferenciar manha de sofrimento. E não é agradável se sentir sacaneado. Mas foi um aprendizado. Pena que às vezes a injustiça saia do lugar e da pessoa que a gente menos espera. Mas a vida tem dessas coisas. E a gente se depara com elas logo cedo.
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