Quem? Meu filho? Prestar atenção no que acontece com ele pode evitar muitos vícios
Meses atrás recebi um adolescente de 16 anos, acompanhado de seus pais, em meu consultório. Logo na primeira frase veio a queixa: “Nosso filho é viciado”. Pensei de imediato estar diante de mais um caso inicial de drogadição, mais especificamente maconha. Mesmo assim, perguntei: “Mas que droga? E desde quando...?” Para minha surpresa, a resposta foi: “Não é nenhuma destas drogas conhecidas, ele é viciado em jogo. É isso mesmo, jogos no computador”.
E aí seguiram-se uma série de informações surpreendentes de um mundo que não era do meu conhecimento. O relato foi de uma programação de jogos que se iniciava por volta da meia noite e seguia até por volta das seis da manhã, com participantes de vários países. Segundo detalharam, envolvia apostas em dinheiro. o conteúdo desses jogos incluía atividades como o assalto a um banco visando a compra de drogas com o dinheiro.
Evidente que a atividade implicava noites sem dormir. Para recuperar o sono, o filho acabava dormindo toda a manhã e parte da tarde, atrapalhando suas atividades escolares.
Estamos novamente diante do dilema entre os benefícios trazidos pela tecnologia, que são inquestionáveis, e o seu uso inadequado. A solução para esses problemas exige estratégias criativas, para as quais eu ainda não estava preparado.
Certamente, aquele adolescente não se tornou viciado em jogos de computador nos dias que antecederam a consulta. Esse comportamento foi se instalando e crescendo por meses ou mesmo anos, em que os pais acreditavam que aquela ocupação do filho estava sendo importante para seu desenvolvimento, ampliando suas habilidades motoras e sua inteligência. Os pais não observaram a qualidade e o conteúdo desses jogos e nem o tempo que a atividade tomava.
Faz parte da conduta do adolescente querer ter sua privacidade, estar só no seu quarto e muitas vezes falar pouco do que está fazendo. É importante que os pais, com o devido cuidado, se interessem e busquem criar mais intimidade para ter acesso ao que está ocorrendo. Essa intimidade não acontece por decreto e deve ser construída pouco a pouco, desde o nascimento. Programas individualizados com os filhos, como saídas para compras, ver um filme ou ler um livro e comentá-lo, permitem diálogos que favorecerão uma relação mais próxima.
Essa intimidade instalada permitirá a observação e intervenção, por parte dos pais, quando houver desvios ou atitudes inadequadas do filho adolescente. Assim, essas atividades poderão ser contornadas, bem orientadas e aceitas sem provocar grandes turbilhões. Dessa forma, não só os jogos, mas também as “drogadições” poderão ser prevenidas.
Dr. Saul Cypel, pai de Marcela, Irina, Eleonora e Bruna, professor livre-docente de Neurologia Infantil, consultor do Programa de Desenvolvimento Infantil da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, diretor do Instituto de Neurodesenvolvimento Integrado (INDI) e neuropediatra.
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